domingo, 25 de agosto de 2013

E SE?



E SE?
José mg

E se por trás deste triângulo houvesse uma
 mulher? E se ele escondesse exatamente
 sua parte mais interessante? E se por
 graça dos deuses nele eu pudesse
me esconder? E se por maior
graça ainda, eu pudesse es
colher?  Em  seu  bico eu
ficaria. Em seu ponto
de equilíbrio onde
a humanidade
  se equilibra,
 eu   me
equi
lib
ra
i
a
.

 

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

TERROR NO CINEMA

" Era dia dos pais. Zemar, pai de filho único e marido de mulher nenhuma, já que era pai solteiro, ou pãe, no dizer dele. Assumira a criação do filho em desde que ele tinha quatro aninhos, pela convicção de que a mãe não poderia criá-lo a contento. Naquele dia convidou o filho a irem passear na cidade grande, no shopping, que os jovens tanto gostam. Foram. Passearam. Viram lojas, produtos, depois se dirigiram para as salas de exibição. Zemar pediu ao filho que escolhesse que filme gostaria de ver. O filho, Joãomar, adolescente de quinze anos, escolheu ver o Capitão América. Zemar não morria de amores pelo gênero, mas, azar o seu. Quem mandou mandar o filho escolher? Deveria ter escolhido ele próprio! Aquele dia era o dia dos pais, não dos filhos… O filme era em 3D. Eles nunca tinham visto um filme em 3D. Entraram para a sala que era pequena. Zemar teve saudade dos antigos cines que fazia questão de ir quando passava pela capital: cine Art Palácio, Brasil, Candelária, Odeon, Paladium… Foram os primeiros a adentrar a sala. Dentre em pouco começaram a aparecerem outros. O filho reparou que todos vinham com óculos escuros na mão. Chamou a atenção do pai para o fato. “Uai”, pensou Zemar. “Será que davam os óculos na aquisição dos ingressos e não deram para ele”? Pediu explicação ao moço da cadeira da frente e ele esclareceu que os óculos estavam numa caixa, perto da porta da sala e que era só pegar. Zemar teve vergonha de sua ignorância. Mas perdoou-se porque era a primeira vez que iria assistir a um filme 3D. Resolveu ele próprio ir buscar os óculos. De seu assento viu uma cortina no cantinho da sala, quase debaixo da tela. Foi até lá. Abriu a cortina e, à fraca claridade das luzes, viu um corredor e lá no fundo do corredor uma larga porta de metal branco. Entrou no corredor. Ao fecharem-se as cortinas a escuridão foi completa. Caminhou firme até tocar a porta. Abriu-a. Ela dava acesso ao lado de fora do shopping. Não entendia. Como aquilo podia ter acontecido? Raciocinou: se saísse para retornar à sala de exibição, teria que comprar outra entrada. Não gostou da idéia. Iria retornar à sala e descobrir o caminho certo. Mas querer não é poder como não diz o ditado popular. Voltou ao corredor. Fechada a porta, a escuridão também voltou. Podia fechar os olhos porque ali eles não estavam tendo serventia nenhuma. Foi em frente. Ao tocar a cortina abriu-a satisfeito, mas sua satisfação fez-se estupefação: a sala não era a que ele estava! Fechou a cortina e titubeou em outra direção. Achou outra cortina. Abriu e deu em outra sala vazia. Começou a sentir medo. A escuridão era total, já se disse. Ficou se recordando de um ou outro filme de terror que tinha assistido. Não quis ver mais. Odiava filmes de terror. Recordava-se de uma estrofe de uma poesia que lera certa vez: "Vivendo se aprende lições guarde esta se puderes: a vida tem coisas lindas, veja as feias se quiseres". Com tanta coisa bonita para se ver na vida e tem gente que perde tempo vendo filmes de terror. Mas ele tinha de se lembrar dos horrores dos filmes de terror logo agora, que estava perdido num labirinto, dentro da maior escuridão? Mas lembrou, malgrado seu. Em um instante as figuras grotescas saíram de sua imaginação e ganharam vida. Poderia gritar, mas não adiantaria porque em uma das salas se exibia um filme barulhento. Conseguiu por fim dominar-se. Aquilo não existia. Existia era um cérebro dominado pelo medo. Retomou o controle e procurou a porta para o exterior. Achou-a. Saiu. Ai, que alívio! Retornou à entrada. Explicou seu drama ao porteiro. Ele entendeu e lhe franqueou a entrada. Ali, perto da porta da sala 7, estava a caixa com os óculos. Maldisse-se. Porque não mandara o filho buscar os tais? Afinal, aquele não era dia dos filhos. Era dia dos pais".

José Maria Gonçalves (Nenzito)

Mulher biônica

MULHER BIÔNICA José MG Eu quero uma mulher, que tenha conteúdo, que saiba discernir, além de sorrir. Que tenha uma alma, que me enleva e me acalma. Que o espírito seja de luz, cheio de esplendor. Não, não importa o exterior. O exterior pode ser modificado ao bel prazer de sua dona. Mas seu interior. No seu interior é que ela mora, tem que ser lindo e imutável ainda que sopre a tormenta. Digo isto por causa do trauma que passei e ao saber meu sofrimento vocês me darão razão. Saí com uma mulher que tinha tudo no lugar. E eu, euzinho mereci a atenção daquela deusa e me perguntava que bem que eu fiz a Deus para merecê-la. Apesar de ser de meia idade, colocava muito mocinha em sua retaguarda. Jantamos. Fomos ao cinema e eu não me cansava de me admirar daquela beleza, ali na mesa: loura, cabelos sedosos, os dentes perfeitos, o sorriso sensual. Os olhos verdes lembravam esmeraldas e eram muito, muito doces. Os cílios longos, charmosos. As pálpebras fechavam e abriam fazendo charme. Dava a tristeza da eclosão das pedras preciosas que ornavam os olhos, depois à explosão da alegria de tornar a mostrá-las. Os lábios, médios. Os seios, ah, os seios! Desnudos pelo decote generoso pareciam esculpidos por um artista de todos os quilates, sem nenhum defeito. Sobre a porcelana da base os bicos de rubi. Após o jantar, fomos a uma danceteria, onde a tive em meus braços, no doce balanceio da valsa, e junto com o calor de seu corpo, senti seus seios rígidos me espetando e despertando o desejo. Seus lábios se ofereciam e meus lábios não os desdenhavam. Nossos lábios buscavam-se e nossas línguas também valsavam ao ritmo de nossos corpos. De comum acordo deixamos o salão de dança e fomos para o apartamento da deusa. Ela colocou uma música suave para servir de fundo à nossa troca de carícias. Quando estávamos em ponto de bala, fomos para o quarto. Deitamo-nos e nos doamos intensamente. Pela manhã, antes de abrir os olhos eu já sorria. Abrindo-os notei a claridade que se coava pela cortina lilás. Levantei-me bem disposto apesar do combate, ou melhor, por causa dele. Abri um pouco a cortina porque eu queria ver bem o monumento que eu tive em meus braços, mas sem acordar a deusa adormecida. Não obstante a suavidade do meu movimento, ela tinha sono leve e acordou e sorriu para mim e neste momento, o mundo ruiu. Acendi a luz para ter a melhor certeza e estarrecido vi: sua peruca loura tinha saído e um cabelo bastante crespo espetava o travesseiro. Os cílios postiços estavam agarradinhos no cobertor deixando desprotegidas as pálpebras ermas, peladas daquele adorno, sem um cilizinho pra remédio. As lentes de contato, verdes, descansavam sobre o criado mudo, vizinhos dos dentes dentro de um copo d’água. Um dos seios estavam retorcidos porque o cilicone tinha se deslocado. Consternado, consegui desenhar um sorriso que deve ter saído uma careta e falei que ia buscar pão e nunca mais voltei.